domingo, 3 de outubro de 2010

A PRINCESA E O LOBO V

Litgarda não conseguia dormir. A rainha vira Remígia a sair. A sua conselheira nunca se esgueirava e nunca agia sem falar com ela antes. Algo se passava. Litgarda sabia. Conseguia sentir que algo estava prestes a mudar. Ela só não sabia o quê e isso estava a enlouquecê-la. Aproximou-se mais uma vez da janela. O seu quarto dava para a saída do palácio por onde Remígia saira e ela queria vê-la regressar. Deu por si a sorrir ao considerar a hipótese de Remígia ter, finalmente, sucumbido aos prazeres da carne, para, acto continuo, rejeitar a ideia em absoluto. A sua conselheira fazia-lhe lembrar, na maior parte do tempo, uma estátua de gelo. A calma e impassividade da mulher muitas vezes a faziam ter vontade de gritar. De abaná-la até que Remígia reagisse. Nunca o fez, claro, mas por isso quase tinha vontade de gargalhar ao imaginá-lo na cama com um dos homens da Terra dos Lobos.

Estava a Rainha perdida nestes devaneios quando a porta do jardim se abriu. A porta para o 'exterior'. E por essa porta viu Remígia e viu o homem que a acompanhara até ali. O que estava Remígia a fazer com Jugurta a meio da noite? Sim, ela sabia que eram eles os responsáveis pela manutenção das relações entre as duas terras, mas, que fosse do seu conhecimento, os dois não tinham o hábito de se encontrarem. Resolviam a maioria dos assuntos à distância. Pôs a mão no fecho da janela com o intuito de a abrir e ouvir o que os dois conversavam. Hesitou. Isso seria uma falta de respeito... Pois que se lixasse, ela era a Rainha. Era sua obrigação saber o que se passava no seu reino. Ou, pelo menos, foi o que disse a si mesmo enquanto rodava o manípulo e entreabria a janela. 

Enquanto olhava o casal no jardim, Litgarda não pôde deixar de reparar que Jugurta em momento algum pisou um milímetro além do limite da propriedade e admirou-o por isso. Era um sinal de respeito. Mesmo sem saber que estava a ser observado, não caiu na tentação de ir contra as leis. E seria tão fácil e tão inofensivo... Mas, ainda assim, o homem não o fez. Mas Jugurta sempre fora assim: respeitador, calmo. Litgarda não poderia ter escolhido melhor se fosse ela a escolher o amigo mais próximo do seu marido. Jugurta estava mais velho, pensou Litgarda com um sorriso. Dezasseis anos era, de facto, muito tempo. O seu cabelo negro estava já salpicado com algum cinzento e o seu rosto estava mais maduro mas nada disso o tornava um homem menos atraente. Lembrava-se bem de como ele e Jefté eram cobiçados pelas mulheres do reino. Antes e depois de Jefté ter casado com ela. Esse pensamento tirou-lhe o sorriso saudosista dos lábios. A culpa não era de Jugurta. Ele era livre de fazer o que bem entendesse com a sua vida, mas ela não conseguia perdoar-lhe o facto de ele ter estado sempre ao lado de Jefté, no bem e no mal. Não conseguia perdoar-lhe por algo que ele não podia ser responsabilizado: os actos de Jefté.

1 comentário:

Rochas disse...

De que altura é esse castelo?