Toda a gente já teve o seu coração despedaçado. Toda a gente já perdeu um grande amor. Toda a gente conhece a sensação de sentir que nunca mais vai conseguir respirar porque sabe que os seus lábios nunca mais vão tocar aqueles lábios. A sensação de asfixia. O aperto no peito. A dor que parece inesgotável. O adormecer e acordar com um único pensamento.
Uma vez senti isso. Entrou na minha vida e instalou-se com a delicadeza de um furacão e saiu passado um ano deixando o cenário de devastação próprio desses fenómenos naturais.
Lembro-me de chorar horas e dias. Lembro-me de me fechar horas e dias a fio em casa. De não comer e de não dormir e de só pensar que queria adormecer para poder ter nem que fosse meia-hora de paz. Lembro-me de me programar todas as manhãs para não sentir. De treinar a minha cara sem expressão ao espelho para não demonstrar qualquer emoção às pessoas que insistiam em colocar um redoma ao meu redor esquecendo-se, na sua boa vontade, que a dor estava entranhada em mim e não a circular à minha volta.
Lembro-me de uma tarde – deve estar agora a fazer 8 anos – em que saí do escritório e conduzi. Conduzi centenas de quilómetros no meu citroen acabadinho de comprar, esquecida da premissa de que a dor estava em mim e que eu não podia fugir dela. Centenas de quilómetros depois, acabei praticamente de onde sai. Sentada a chorar copiosamente no passeio de um parque de estacionamento público. Exausta, sem forças e sem saber para onde ir. Parecia quando se tira o ar a um balão e ele não consegue mais erguer-se e voar. Lembro-me da saia branca e azul que usava. O top de alcinhas. As sandálias beges com a mala de mão a condizer. Não sei quanto tempo fiquei ali a olhar para a matrícula do carro e a chorar até ter ligado para casa a pedirem que me viessem buscar. Não para a minha casa onde eu adivinhava que já estariam mais 1 ou 2 amigos à espera para me ‘animarem’ e não me deixarem pensar. Liguei para Casa!
O meu pai apareceu pouco depois. Não me lembro como fui para casa. Se conduzi, se foi a S que levou o meu carro, se levei o carro de todo. Não me lembro…
Lembro-me que já me teria acalmado quando cheguei a casa deles e parado de chorar, mas quando estava no alpendre para entrar, algo aconteceu e debulhei-me em lágrimas outra vez.
Lembro-me que o meu pai me deu o braço e andámos. Andámos muito tempo pelos campos em volta da casa. Lembro-me que ele me falou de corações partidos e de como sabia que eu jamais acreditaria nele naquele momento quando ele me dissesse que o tempo ia amenizar aquela dor. E lembro-me que olhei para ele e pensei que estava na hora de recomeçar a minha vida e muito depressinha. É que eu tinha posto um homenzarrão de 1,85 m, só de calções e havaianas, a passear no meio de campos (e o meu Pai era mesmo um homem de mar), com um braço dado comigo e no outro braço, muito aconchegada junto ao cotovelo, a minha malinha bege repousava delicadamente. Lembro-me de olhar para ele e pensar que ser Pai era aquilo: nem pensar nas figuras que se está a fazer enquanto uma das nossas crias sofre.
Lembro-me hoje disto e sei que ele tinha razão: o tempo suaviza as dores dor coração partido. O tempo deixa-nos as recordações que com o seu decorrer nos fazem sorrir. Mas hoje quando me lembrei disto não sei porquê, não foi o coração partido e já tantas vezes remendado que me doeu, foram as saudades de ouvir o homemzarrão perguntar quando entrava em casa: “Então, miúda, já chegaste?” quando eu estava bem à sua frente.
12 comentários:
Agora fiquei de coração apertado.
Post feliz na sua força e verdade.
Fez-me lembrar o meu. Partiu cedo. cedo demais, mas retenho lembranças. Assim, como tão bem as recontou aqui.
abraço
E essa é aquela saudade k nunca ameniza, não é?
Beijo no teu coração ;)
...
Que post fabuloso...ainda me lembro de te posto o meu homenzarrão a dar um iogurte natura à boca da cria com com vinte e picos anos que não se alimentava há quase uma semana...isto vindo de um pai que nem uma fraldinha havia mudado!!
Aprendi duas lições fabulosas:
1º- não se morre de amor
2º- a familia é o mais importante
Nunca se esquece e nunca passa.
Mas aprende-se a viver com isso.
Assim, como tu estás a escrever. às vezes, de uma forma triste, mas bonita.
abraço.
Gosto muito de saber que existes.
peixa maria, hoje é a minha vez: gosto muito de ti!
o meu pai diz coisas assim e lembrei-me de como eu e a minha mãe riamos quando lhe dávamos um beijo à chegada e ele respondia "adeus"...
E, ao fim ao cabo, mais do que o vil metal, o que nós melhor guardamos e acarinhamos são as recordações e são elas que nos põem um sorriso nos lábios.
Tantos de vocês que sabem o que sinto e tanta gente que nos deixou cedo demais.
Dasse...
(Belo dia para lembrares estas coisas)
(Se eu soubesse tinha atrasado a coisa, uns dias)
:o)
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